A tendência para um garoto nessa situação é focar totalmente no futebol. No entanto, duas pessoas foram fundamentais para que o estudo não saísse dos meus planos. E isso me ajudou bastante ao longo da minha carreira.
Uma das minhas irmãs mais velhas, a Lena, é formada em Letras, professora de francês. A pessoa mais insistente que conheço. Sempre que eu ia viajar com a delegação para algum campeonato, ela colocava um livro no meio dos uniformes que eu levava para a concentração.
Toda vez era isso. Eu cheguei a perder a paciência com ela.
— Ô, Lena, tu colocou um livro na minha bolsa de novo?
— Bah, vai que dá vontade de ler…
— Poxa, tu sabe que eu não tenho o hábito da leitura. Não vou ler.
— Quem sabe um dia atrasa o voo, atrasa o ônibus, a viagem é longa, tu pega e sente vontade de ler…
Te disse que ela era insistente, né?
Mas não é que um dia o ônibus atrasou, o avião não saiu no horário e… Eu peguei o livro… E comecei a ler…
E não parei mais.
Virei o cara que os guris do time olhavam e diziam: “Lá vem o Roger, com o livro na mão”. Eu sempre estava lendo alguma coisa no tempo livre. No aeroporto ou na concentração, na fase boa ou na fase ruim, eu mergulhava nos livros como se fosse a coisa mais importante do mundo. Eles eram meu ponto de fuga do ambiente de pressão que envolve o esporte de alto rendimento.
A insistência da Lena valeu a pena. O hábito da leitura, esse gosto pelo acúmulo de conhecimento, me transformou em um jogador mais consciente da minha profissão, do aspecto social do futebol e das oportunidades que eu havia conquistado através dele. Também me tornou mais crítico do que acontecia à minha volta.
Esse conhecimento tu quer dividir com mais gente. Hoje, como treinador, outro hábito que eu tenho é o de presentear meus atletas com livros. Digo a eles que, quando tu abre um livro, tu abre uma janela para o mundo. E a cada janela que tu abre, tu enxerga o mundo de um jeito diferente.”
Roger Machado. #ArquivoTPT
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