“Glorioso Imortal”
Por Guilherme Diniz
Esquadrão Imortal – Botafogo 1957-1964 - Imortais do Futebol
Grandes feitos: Bicampeão do Torneio Rio-SP (1962 e 1964), Campeão do Torneio de Paris (1963) e Tricampeão Carioca (1957, 1961 e 1962).
Time base: Manga (Adalberto); Paulistinha, Tomé (Jadir), Zé Maria e Nilton Santos (Rildo); Airton e Pampolini (Édison); Garrincha, Didi, Quarentinha (Amarildo) e Zagallo (Paulo Valentim). Técnicos: João Saldanha (1957-1959), Paulo Amaral (1960-1961), Marinho Rodrigues (1961-1963) e Geninho (1964).
A seleção brasileira que encantou o mundo nas Copas de 1958 e 1962 só foi o que foi graças, principalmente, a dois clubes do futebol nacional: o Santos e o Botafogo. Ambas as equipes cederam os principais jogadores que transformaram o Brasil em sinônimo de futebol arte, embora hoje isso já não seja uma realidade… Se o Santos cedia Zito, Gilmar, Mauro Ramos e Pelé, o Botafogo oferecia Nilton Santos, Didi, Zagallo e Garrincha. O alvinegro carioca contou, de 1957 até 1964, com o seu melhor e maior esquadrão em todos os tempos, talvez o único no Brasil a conseguir enfrentar de igual para igual o Santos de Pelé. O time abusava do jogo ofensivo, dos gols em propulsão e, claro, do espetáculo. O Maracanã vivia lotado para acompanhar a frieza do goleiro Manga, a classe de Nilton Santos e Didi, o fôlego de Zagallo, a habilidade e velocidade de Quarentinha e Amarildo e a mais pura essência do drible fácil e desconcertante do genial Garrincha. O Glorioso da estrela solitária fez sorrir seu torcedor e a todos os amantes do futebol naqueles anos mágicos. É hora de relembrar.
Safra mágica
Depois de unificar o nome e o clube Botafogo de Futebol e Regatas, em 1942, com a fusão do Club de Regatas Botafogo e o Botafogo Football Club, a equipe teve de esperar um bom tempo para voltar a brilhar no Rio de Janeiro. Culpa do Vasco, que simplesmente dominou o estado e o Brasil naquela década de 40 com o seu famoso “Expresso da Vitória”, campeão de tudo no período. Mesmo assim, o Fogão ainda faturou o Carioca de 1948, derrotando justamente o grande Vasco na final. Naquele Botafogo campeão, despontava um jovem talento que seria um dos principais e mais lendários jogadores do futebol nacional e mundial: Nilton Santos, lateral-esquerdo de puro talento, ousadia e moderno para seu tempo. Os anos se passaram e o Botafogo foi pincelando talentos em suas categorias de base. Foi então que na segunda metade da década de 50 o time já contava com Garrincha, Quarentinha, Paulo Valentim, Didi (comprado do Fluminense), Tomé, Pampolini e outros. Para comandar um time que já era estrelado e muito promissor, outro craque: João Saldanha, o João “sem medo”. Pronto. O Botafogo estava formado e pronto para dar show.
O Carioca épico
Em 1957, o Botafogo voltou a conquistar o Campeonato Carioca de maneira incrível. O time mostrou ao longo da competição um faro de gol absurdo, principalmente com Didi, Quarentinha, Garrincha e Paulo Valentim. Na grande decisão, contra o Fluminense de Castilho, Pinheiro, Telê Santana e Escurinho, o alvinegro deu o maior baile da história do profissionalismo do futebol carioca em uma decisão de campeonato: 6 a 2, com cinco gols de Paulo Valentim (artilheiro do torneio daquele ano com 22 gols). Até então, a maior goleada havia sido na era do amadorismo, aplicada justamente pelo mesmo Botafogo contra o Fluminense, em 1910, por 6 a 1.
Foi um espetáculo, que serviu para o técnico da seleção, Vicente Feola, abrir os olhos e levar os grandes craques alvinegros para a Copa da Suécia, em 1958. O resultado, todos conhecem: Brasil campeão mundial. Nos anos seguintes, o Botafogo não conquistou nenhum título, mas mesmo assim seguiu forte e sempre entre os primeiros do estado. Foi então que, a partir de 1961, a equipe de Garrincha começaria a levantar taças e mais taças. E a ficar conhecida no mundo inteiro.
Começa o apogeu
Com um time ainda mais forte, reforçado por Zagallo e Amarildo, o Botafogo voltou a celebrar um título carioca em 1961, ao derrotar o Flamengo na final por 3 a 0, com dois gols de Amarildo (artilheiro da competição com 18 gols) e um de China. O título serviu como estímulo para o Botafogo iniciar sua hegemonia no Rio com exibições de gala e canecos.
Em 1962, ano em que o Brasil conquistou o bicampeonato mundial, no Chile, graças novamente a estrelas do Fogão como Didi, Garrincha, Amarildo e Nilton Santos, o time carioca conquistou mais um título estadual, de novo sobre o Flamengo e pelo mesmo placar (3 a 0), com uma atuação de gala de Garrincha, que marcou dois gols (o outro foi de Vanderlei, contra). No mesmo ano, o time conquistou o Torneio Rio-SP com uma campanha impecável: sete vitórias e apenas uma derrota em oito jogos, com 20 gols marcados e oito sofridos. Na final, o esquadrão alvinegro derrotou o Palmeiras por 3 a 1, com dois gols de Amarildo e um de Quarentinha. O Botafogo conquistava, enfim, o prestigiado torneio, que só ficava atrás da Taça Brasil na época.
Os embates contra o Santos de Pelé
Em 1963, o Botafogo teve duelos históricos e eletrizantes contra o Santos de Pelé. No começo do ano, as equipes decidiram a Taça Brasil do ano anterior. No primeiro jogo, disputado no Pacaembu, o Peixe venceu por 4 a 3, com dois gols de Pepe, um de Coutinho e outro de Dorval, com Quarentinha, Amoroso e Amarildo marcando para o Botafogo. No jogo de volta, no Maracanã, os cariocas venceram por 3 a 1, com gols de Édson, Quarentinha e Amarildo, forçando um terceiro jogo no mesmo Maracanã. Na partida derradeira, os alvinegros não resistiram ao esquadrão de Pelé, e foram goleados por 5 a 0. Meses depois, o Santos voltou a bater no Botafogo, mas pelas semifinais da Copa Libertadores. No primeiro jogo, as equipes empataram em 1 a 1. Na volta, o então campeão continental (Santos) venceu por 4 a 0 e foi para a final, onde conquistaria o bicampeonato.
Mas aquele ano não foi só de tristezas para o Botafogo. O time começou a excursionar pelo mundo, assim como o Santos, e mostrar aos gringos todo o talento daquele esquadrão de Didi, Garrincha e Cia. O time venceu em 1963 o Torneio de Paris, ao derrotar o Anderlecht (BEL) por 1 a 0 (gol de Amarildo), e o Racing Club (FRA) por 3 a 2 (gols de Quarentinha, Jair Bala e Amarildo). A equipe disputou inúmeros torneios no período e venceu quase todos eles, como o Torneio Internacional da Colômbia, Torneio Internacional da Costa Rica, Torneio pentagonal do México, Torneio Jubileu de Ouro de La Paz, Panamaribo Cup e outros. Disputar esses campeonatos ajudou muito a internacionalizar o Botafogo, fazendo do time o segundo mais conhecido do Brasil no exterior, atrás do Santos, obviamente. O lado negativo dessas excursões foi enfraquecer o time nas disputas internas. Mas em 1964, a torcida voltaria a sorrir.
"Meia” revanche contra o Santos
Em 1964, o Botafogo conquistou o bicampeonato do Torneio Rio-SP, depois de vencer sete jogos e perder dois em 9 partidas disputadas, com 21 gols marcados e nove sofridos. O time fez a final contra o temido Santos, e venceu o primeiro jogo por 3 a 2. Era preciso um jogo de volta, mas pelo fato de as equipes estarem sempre viajando, as federações do Rio e de SP decidiram dar o caneco a ambos. Foi de certa forma injusto, afinal, o Botafogo derrotou o Santos no primeiro jogo e conseguiu sua revanche do ano anterior. Mas, ficou por isso mesmo. Naquele ano, a vitoriosa geração do Fogão passaria o bastão para novos craques que estavam chegando, como Jairzinho, Gérson e Cia. Era a transição das estrelas.
Um Botafogo eterno
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Nilton Santos, imortal do Botafogo.
Depois do Rio-SP de 1964, o Botafogo mudou suas estrelas, mas não enfraqueceu nem um pouco. Pelo contrário: continuou forte e vencedor, vencendo mais um Rio-SP em 1966, dois Campeonatos Cariocas em 1967 e 1968 e uma Taça Brasil em 1968.
Mesmo assim, aquele esquadrão não conseguiu superar os shows, os gols e a idolatria conquistada pelos gênios que vestiram o preto e branco do Glorioso de 1957 até 1964, uma equipe que mesmo tendo vários treinadores, não perdeu sua identidade e seu padrão de jogo, que era envolver o adversário na habilidade, na velocidade e, claro, nos gols. O Botafogo de Manga, Nilton Santos, Zagallo, Didi, Quarentinha, Amarildo e Garrincha foi um dos melhores times da história do futebol nacional e mundial, entrando, inclusive, na lista da FIFA dos maiores clubes do século XX, ficando à frente de Benfica, Independiente, Boca Juniors, Internazionale e Arsenal. Coisa de gente grande. E de gênios imortais.
Os personagens:
Manga: era uma apoteose no gol do Botafogo, com suas pontes que enchiam os olhos da torcida, uma frieza impressionante e muita segurança, mesmo ficando exposto pelo esquema super ofensivo do Botafogo. Foi ídolo e é considerado o melhor goleiro da história do clube. Disputou 442 partidas pelo clube alvinegro.
Adalberto: muitos dizem que o goleiro Adalberto era melhor que Manga… Se era ou não, é impossível dizer, mas o jogador marcou época no Fogão e foi um dos destaques da histórica conquista do Carioca de 1957, no show que o time alvinegro deu no torneio. Foi grande amigo de Nilton Santos e tinha o lateral como seu fiel escudeiro.
Paulistinha: um dos grandes ídolos do Botafogo nos anos 60, Paulistinha jogava bem tanto como lateral quanto como zagueiro. Fez 308 jogos pelo clube e conquistou muitos títulos.
Tomé: foi um dos grandes defensores do Fogão na década de 50. Participou da conquista do Carioca de 1957.
Jadir: veio de uma grande carreira no Flamengo para ser campeão estadual em 1962. Era muito forte na marcação. Curiosamente, foi ele quem lesionou Zagallo em 1958 e deixou o Velho Lobo quase nove meses sem jogar.
Zé Maria: despontou na zaga do Botafogo em 1960, onde fez dupla com Nilton Santos, Ademar e outros. Muito regular.
Nilton Santos: é o maior jogador da história do Botafogo, ao lado de Garrincha, o melhor lateral-esquerdo do século XX e um dos maiores mitos do esporte no mundo. Vestiu apenas o preto e branco do Botafogo e o amarelo da seleção brasileira ao longo de sua carreira. Pelo seu lado, partiam cruzamentos perfeitos, passes precisos e muita disposição, além de categoria e eficiência na defesa. Disputou 723 partidas pelo clube e ganhou até estátua. Uma lenda botafoguense.
Rildo: solidário, forte na marcação e extremamente regular, Rildo foi um dos grandes laterais de seu tempo, além de ter brilhado muito no Santos de Pelé. No Botafogo, tinha a duríssima missão de superar Nilton Santos, o que, claro, não conseguiu. Mas não teve problema, pois o jogador conseguiu seu espaço quando Nilton Santos passou a atuar na zaga.
Airton: foi um talentoso volante do Botafogo de 1958 até 1965, jogando muito e ajudando demais o meio de campo do time carioca a brilhar naquela época, atuando, às vezes, como um cabeça de área.
Pampolini: outro ótimo volante do Botafogo, jogou no clube de 1955 até 1962. Disputou 347 pelo time alvinegro.
Édison: jogava no meio de campo, ajudando na marcação e dando passes para a linha de frente fazer os estragos necessários nos rivais. Foi essencial nas conquistas do time naquela época. Disputou mais de 200 jogos pelo clube.
Didi: um dos maiores meias do futebol nacional, Didi foi o gênio e maestro do meio de campo do Botafogo e da seleção brasileira na conquista das duas Copas do Mundo de 1958 e 1962. Elegante, cheio de classe e inteligentíssimo, Didi deu a mais pura arte ao Botafogo. Um ícone eterno em General Severiano.
Zagallo: armador pela esquerda, Zagallo ganhou o apelido de formiguinha por não parar um segundo sequer em campo, ajudando tanto o ataque quanto a defesa do time. Um dos mais vitoriosos esportistas do planeta, Zagallo foi ídolo no Botafogo e colecionou títulos de 1958 até 1965.
Paulo Valentim: foi um dos grandes atacantes brasileiros no final da década de 50, entrando para a história do Botafogo graças a sua atuação magistral na final do Carioca de 1957, quando marcou cinco dos seis gols do time contra o Fluminense. Fez parte do melhor ataque da história do clube e presenteou a torcida com muitos golaços. Fez 135 gols com a camisa alvinegra.
Quarentinha: é, até hoje, o maior artilheiro da história do Botafogo com 313 gols em 442 jogos pelo clube alvinegro. Deixava a torcida doida da vida por nunca comemorar seus gols, e dizer que “não via razão para festejos, afinal, estava apenas cumprindo sua função e era pago para isso”. Mesmo com essa característica peculiar, o craque fez história no clube e entrou para o rol dos imortais do Botafogo, causando o terror nos adversários. Ídolo.
Amarildo: o “Possesso” foi genial e infernal no ataque do Botafogo naqueles anos 60. Com uma habilidade incrível, faro de gol apurado e vivendo grande fase, o atacante marcou 136 gols em 231 jogos com a camisa alvinegra, além de ajudar a equipe a levantar vários canecos.
Garrincha: o maior ponta direita do futebol brasileiro e mundial começou a encantar o planeta vestindo o preto e branco do Botafogo. Suas pernas tortas “entortaram” zagueiros, laterais e goleiros. Seu jeito moleque, inocente e arisco conquistaram para sempre o torcedor botafoguense. É o maior ídolo da história do Botafogo, terceiro maior artilheiro do clube com 243 gols em 612 jogos e pra sempre no coração não só do torcedor alvinegro, mas também do torcedor brasileiro, afinal, Mané carregou a seleção nas costas na Copa de 1962, após a contusão de Pelé. Seus dribles, jogadas, passes e gols deram o bicampeonato ao Brasil, e o imortalizou como um dos maiores da história do futebol. Foi gênio.
João Saldanha, Paulo Amaral, Marinho Rodrigues e Geninho (Técnicos): com tantos craques, o Botafogo viveu uma situação parecida com a do Santos na década de 60: todos sabiam a escalação da equipe de cor, mas quase ninguém sabia quem era o técnico do time… Mas justiça seja feita: o quarteto Saldanha-Amaral-Rodrigues-Geninho foi o principal responsável por organizar e fazer tinir o Botafogo naqueles anos mágicos, principalmente o fanático João Saldanha, botafoguense de coração, entendido demais de futebol e uma lenda no clube. Sem ele, e sem os outros treinadores que passaram pelo time no período, as estrelas alvinegras ficariam solitárias. Felizmente, isso não aconteceu.
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